“A Morte de Ivan Ilitch” é um livro de Liev Tolstói, publicado em 1886. O livro mostra Ivan Ilitch, um respeitado juiz, passando pelo seu casamento, sua ascensão na profissão, até ser acometido por uma doença e não saber mais se lutava ou não pela vida.
Prestes a morrer, Ivan percebe que toda sua vida foi uma mentira, que tudo era questão de aparência e que não podia confiar em ninguém, só em seu filho e seu criado.
Ilitch mostra que o meio social em que foi criado fez ele tornar-se tal pessoa, mas que isso não passou de uma grande mentira, a beira da morte ele estava completamente infeliz.
Pois bem, o convívio social é algo ingrato em muitos momentos. Existe uma pressão gigantesca em vários aspectos: arrume uma namorada, case, tenha filhos, passe em um concurso, financie uma casa… as pessoas acham que tem o direito de agir sobre sua vida, em muitos casos a pressão familiar é tão grande que acabamos aceitando essas “sugestões”.
Mas esse não é exatamente o ponto que quero abordar no post. Apesar de Ivan ter sofrido o que sofreu, muito em parte, por causa de sua profissão, mas o que quero abordar é o individualismo e a falta de empatia.
O livro começa narrando o velório de Ivan, e logo no terceiro parágrafo já somos apresentados ao seguinte contexto.
“Praskóvia Fiódorovna Golovina tem o profundo pesar de comunicar, a seus parentes e amigos, o falecimento do seu querido esposo, o juiz Ivan Ilitch Golovin, ocorrido a 4 de fevereiro de 1882. O féretro sairá sexta-feira, à uma hora da tarde”.
“Ivan Ilitch era colega dos cavalheiros ali presentes e muito estimado por todos. Há várias semanas encontrava-se enfermo e era voz corrente que não se restabeleceria. Não fora substituído, mas cogitava-se que a sua vaga pudesse ser preenchida por Alieksiéiev, e para o lugar deste fosse Vinikov ou Stabel. Assim sendo, ao tomarem conhecimento da morte do colega, o que primeiramente ocorreu a cada um foi a possibilidade própria ou dos amigos nas promoções e transferências que ela iria provocar“.
Note, o comunicado do falecimento foi dado, qual a primeira reação ao saber que um amigo estimado faleceu?
Dor? Angústia? Compaixão pelos entes que ficaram? Não… “. (..) o que primeiramente ocorreu a cada um foi a possibilidade própria ou dos amigos nas promoções e transferências que ela iria provocar”.
Se você trabalha em uma grande empresa, já deve ter visto tal ocorrido. Alguém morre ou é afastado, ninguém se importa, todos querem saber das promoções.
___
Na página seguinte…
“Além das considerações sobre as prováveis promoções e transferências que a morte de Ivan Ilitch acarretaria, a própria morte de pessoa tão próxima deles despertou, como de costume, em cada um dos membros do tribunal a tranquilizadora sensação de que escapara”.
Isso mesmo, além das promoções, a outra sensação foi de tranquilidade, afinal, antes ele do que eu.
E não vamos ser hipócritas. Todo mundo é assim. Inclusive esse que voz fala. Duvido que existam mais do que 3 ou 4 pessoas que você daria sua vida.
___
Outro trecho que chama atenção é esse: “Quanto aos amigos mais chegados de Ivan Ilitch, os chamados íntimos, unânime e involuntariamente consideravam os aborrecidos deveres a cumprir – acompanhar o enterro e fazer uma visita de pêsames à viúva”.
Sou seu amigo, apenas nas horas das festas. Na hora que o bicho pega eu quero ir embora, onde já se viu ter que ficar consolando a viúva? Nesse caso não é todo mundo que age dessa forma, mas existe uma grande parcela da população que faz isso.
___
Já deu para ver a mesquinharia que cercava tal juiz, mas ainda não acabou…
“O rosto de Schwars, ornado de suíças à inglesa, e toda a sua magra figura, em traje de circunstância, expressavam a sua peculiar e solene elegância, e tal solenidade, contrastando com seu gênio folgazão, tinha ali, mais do que nunca, um pitoresco sabor. Assim, pelo menos, foi o que pareceu a Piotr Ivánovitch. E, tendo deixado as damas passarem na frente, subiu vagarosamente a escada. Schwarz não descera; esperara-o no patamar.
Piotr Ivánovitch percebeu logo o que retinha: queria combinar um lugar onde pudessem, mais tarde, jogar uma partidinha de uíste”.
Novamente entra o ponto. Não quero participar do funeral, só quero jogar meu carteado em paz! Sim, o ser humano é muito mesquinho.
___
O texto prossegue, para então, acabarmos de confirmar, não é apenas uma pessoa que age dessa forma, é todo o meio que cerca Ivan Ilitch.
Piotr Ivánovitch ofereceu-lhe o braço (para viúva) e foram para o interior da casa, passando por Schwarz, que lançou ao amigo um olhar misto de compaixão e malícia, que assim poderia ser traduzido: “Lá se vai o nosso joguinho por água abaixo! Não reclame se arranjarmos outro parceiro. Se conseguir se livrar a tempo, poderemos talvez formar uma mesa de cinco…”
Notou? A mesquinharia predominava no ambiente.
Abutre existe em todo lugar, é fato. Você sempre vai encontrar com pessoas que só pensam em si. Novamente, sem hipocrisia, todo mundo tem sua individualidade, mas não podemos deixar que isso nos torne mesquinhos.
A Morte de Ivan Ilitch deixa evidente duas grandes lições. As duas meio que se equivalem, mas são extremamente úteis: não viva a vida que eles (sociedade e familiares) querem que você viva. Sim, você deve trabalhar e viver em harmonia com todos, mas sempre procurando o que lhe faça feliz.
E o segundo ensinamento é o mais belo de todos, algo que todo mundo diz, mas que quase ninguém faz: cerque-se de boas pessoas, esqueça o quantitativo, foque no qualitativo.
Junte as duas lições e faça o dever de casa, se não, no final de sua vida, você vai ser só mais um amargurado.
___
Não deixe de conferir.
5 trechos do livro 1984 que fala da classe proletária
4 excelentes livros sobre empreendedorismo e vida pessoal
5 trechos marcantes do livro Trem Noturno para Lisboa (Parte 2)