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Café Arcaico | Superman – O Filme

“Você será diferente.
Algumas vezes se sentirá como um excluído,
Mas nunca estará sozinho.
Fará de minha força a sua.
Verá a minha vida através de seus olhos,
Assim como a sua vida, será vista através dos meus.
O filho se torna o pai e o pai se torna o filho.”

Em Dezembro 1978, o diretor Richard Donner, juntamente com os produtores Alexander Salkind, Ilya Salkind e Pierre Spengler, através dos estúdios Warner Bros., traziam para o cinema o “pai” de todos os filmes de super heróis. Superman – O Filme chegou às telonas com status de super produção, com um elenco estelar, um ótimo roteiro e uma produção revolucionária, fazendo jus à toda expectativa criada.

Superman, personagem criado por Jerry Siegel e Joe Shuster, que teve sua primeira aparição em 1938, na Action Comics #1 (revista em quadrinhos que é considerada o marco zero das HQs americanas de super heróis) já havia sido adaptado para a TV em uma telessérie estrelada por George Reeves, durante os anos cinquenta, mas o projeto do produtor Ilya Salkind, com o seu pai Alexander Salkind era diferente, era ambicioso, tencionavam a redefinir os padrões das adaptações de HQs, e contavam com um orçamento de cinquenta e cinco milhões de dólares.

Para que o projeto ganhasse credibilidade, procuraram se aliar a pessoas de renome em Hollywood, para o roteiro escalaram Mario Puzo, co roteirista e autor do clássico O Poderoso Chefão (The Godfather, 1972), e para o elenco buscaram os já consagrados e vencedores do Oscar, Marlon Brando e Gene Hackman, para viverem respectivamente, Jor-El, pai biológico de Superman e Lex Luthor, seu arqui-inimigo. Com esses nomes já começaram os trabalhos de marketing, buscando patrocínios, e um cartaz foi lançado, com esses astros creditados e com a seguinte frase: “Você vai acreditar que o homem pode voar”. Pronto, a expectativa estava criada.

A intenção dos produtores era rodar e lançar dois filmes de forma simultânea e para colocar em prática esse projeto, o diretor escolhido foi o britânico Guy Hamilton, conhecido por ter dirigido alguns filmes da franquia de James Bond, mas logo abandonou o barco. Diversos diretores foram considerados, George Lucas (que não pode pois estava envolvido com Star Wars), Francis Ford Coppola, Steven Spielberg, Sam Peckinpah, entre outros. Enquanto isso, três roteiristas foram contratados para revisar o texto de Mario Puzo e retirar alguns excessos, trabalho que ficou a cargo de David Newman, sua esposa Leslie Newman e Robert Benton. A pré produção estava encaminhada, com alguns atrasos e ainda sem diretor, até que, em 1976, os Salkind assistiram à uma obra de terror recém lançada nos cinemas e que obteve um grande êxito, chamada A Profecia (The Omen), e não tiveram dúvidas de que aquele diretor de extrema competência deveria ser o condutor de seu grandioso projeto, esse diretor era Richard Donner. E a partir dai, tudo começou a mudar de patamar.

Richard Donner ao assumir a responsabilidade, definiu que deveriam fazer algo maduro, adulto, uma obra de respeito, então, trouxe consigo o roteirista Tom Mankiewicz, para que este fizesse mais um revisão, pois o roteiro não estava de seu agrado, algumas “bobagens” seriam retiradas, o mais marcante desses absurdos inseridos pelos roteiristas era uma cena em que Superman encontraria o famoso detetive Kojak, do popular seriado dos anos sessenta da CBS, estrelado por Telly Savalas (Obrigado, Donner e Mankiewicz por ter nos poupado disso). O sindicato dos roteiristas não autorizou Mankiewicz a ser creditado com a sua verdadeira função, então, seu nome nos créditos inciais aparece como Consultor Criativo, e no final das contas, nada de Mario Puzo fora utilizado.

Diversos atores foram cotados para o papel protagonista, Sylvester Stallone, Paul Newman, Al Pacino, Robert Redford e até mesmo o pugilista e campeão mundial Muhammad Ali, porém, Donner queria que o herói fosse interpretado por alguém desconhecido, para que este ficasse marcado pelo papel (mais um de todos os acertos do diretor acerca da obra). O jovem Christopher Reeve, de 25 anos, ator de alguns programas de TV, a principio não se interessou pelo papel ao fazer o teste, mas depois, ao reler o roteiro, já “retocado” por Mankiewicz, se convenceu a protagonizar o nosso grande herói.

Após treinos intensos com o halterofilista e ator britânico David Prowse (conhecido por interpretar fisicamente Darth Vader), Reeve adquiriu a massa muscular necessária para trajar a famosa roupa azul, capa e botas vermelhas e a tão marcante cueca, também vermelha, por cima do traje. E olha, não sei dizer o que seria de Superman sem Christopher Reeve, nunca um ator foi tão marcante na pele de seu personagem como Reeve o foi protagonizando o super herói kryptoniano. E além disso, seu desempenho como Clark Kent também é memorável, seu timing para o humor é impecável, suas mudanças camaleônicas ao atuar como Clark e Kal-El são de uma maestria jamais vista. Muitos sempre questionam como Superman conseguia esconder sua identidade se utilizando apenas de um par de óculos, mas Reeve é uma prova de que isso era sim possível.  Outro fator a ser destacado em sua atuação é a sua forma de voar, claro e óbvio que toda a equipe de efeitos especiais foi de extrema importância e revolucionária pra época em suas técnicas para simular o voo do herói, inclusive, vencendo o Oscar nessa categoria, mas a desenvoltura do protagonista é algo sem palavras, suas poses, sua sutileza, a naturalidade de Reeve tornou tudo isso crível. A equipe de efeitos realizou o que dizia o anúncio do filme “Você vai acreditar que o homem pode voar”, mas Christopher Reeve tornou isso algo mágico.

O jovem astro nunca conseguiu se desvencilhar de seu maior personagem, sempre tendo sua imagem associada ao Homem de Aço, papel que ele interpretou até 1987.

Um grave acidente equestre lhe deixou tetraplégico, após a queda de um cavalo, fraturando as duas primeiras vértebras cervicais, em 1995, e desde então, Reeve dedicou sua vida ao ativismo, criando a Christopher Reeve Paralysis Foundation, sempre lutando pelos direitos e visando melhorar a vida das pessoas com necessidades especiais iguais a ele, vítimas de algum tipo de paralisia, brigando também pela pesquisas com células tronco, aliás, até se submetendo à cobaia das pesquisas. E mesmo em sua condição, não deixou de atuar e dirigir, sempre se manteve ativo e inspirador, até sua morte em 10 de outubro de 2004, vítima de um infarto. De fato, ele era o verdadeiro Super Homem.

A trilha sonora foi a última coisa a ser inserida na produção, e para isso foi escalado Jerry Goldsmith, famoso músico compositor da banda sonora de Planeta dos Macacos (Planet of the Apes, 1968) e que recentemente havia trabalhado com Donner em A Profecia. Mas Goldsmith abandonou o projeto, sendo John Williams seu substituto, e aqui está outro ponto alto do filme. Não que Jerry Goldsmith não daria conta, pois era um excelente músico, mas é impossível pensar em Superman sem o icônico tema composto por Williams, além de todo o trabalho épico realizado por ele para o filme, conduzindo a Orquestra Sinfônica de Londres. John Williams que é um gênio da música, sem dúvidas um dos maiores de todos os tempos, frequentemente premiado, compositor de trilhas históricas como a de Tubarão (Jaws, 1975), todos da franquia Star Wars (desde 1977), Contatos Imediatos do Terceiro Grau (Close Encounters, 1977), todos da franquia Indiana Jones (desde 1981), E.T.- O Extra Terrestre (E.T – The Extra Terrestrial, 1982), A Lista de Schindler (Schindler’s List, 1993), Jurassic Park (1993) entre outros, beirou a perfeição em Superman, certamente estando no hall das trilhas mais marcantes de todos os tempos.

Com o atraso na produção, orçamento estourado, Richard Donner e os Salkind se desentendendo o tempo todo, muito em função da mudança de rumo que o diretor tinha dado à obra, a Warner Bros. pressionou para que o primeiro filme fosse finalizado logo e lançado, assim, tentando arrecadar verba para finalizar o segundo. Dessa forma, Superman – O Filme chegou aos cinemas próximo ao Natal de 1978, sem mesmo ter uma pré estréia, e finalmente, o público pode presenciar em tela um ótimo, na verdade, o melhor exemplo de como se fazer um filme de origem, praticamente tendo três filmes diferentes em um.

Antes de falar sobre o andamento da película, preciso ressaltar a abertura, que abertura! Os créditos iniciais começam a voar em direção à tela, com notas curtas da trilha dando o clima, criando a expectativa, a música vai crescendo, e quando irrompe em seu ápice, o tema principal ecoa com o título do filme surgindo, e na verdade, nem seria necessário passar o nome, a música fala por si. E ao término desse momento marcante, ao longo de seus quase cinco minutos, elencando a produção, já sabemos que ali se tem um clássico do cinema. Mas vamos ao filme:

A primeira parte se passa em Krypton, um planeta que estava em risco de iminente de extinção, devido a uma futura colisão com o sol. Assim, Jor-el (Marlon Brando), um renomado cientista e membro importante do conselho kryptoniano, e sua esposa Lara (Susannah York) afim de salvarem seu único filho, o ainda bebê Kal-el, o enviam para a Terra, aonde, devido a sua atmosfera e gravidade, o jovem seria diferente, com poderes especiais.

A segunda parte se passa em Smalville, pequena cidade fictícia no estado do Kansas, aonde a nave do menino cai, sendo encontrado pelo casal já de meia idade, Jonathan Kent (Glenn Ford) e Martha Clark Kent (Phyllis Taxter). Nesse cenário, o jovem, já batizado como Clark Kent, chega a adolescência, interpretado por Jeff East, vivendo com seus pais em uma propriedade rural, já ciente de seus poderes, e passando por um drama por se sentir deslocado, vazio, angustiado, por ser capaz de fazer qualquer coisa, mas ter que esconder todos os seus atributos. Ali ele fica até a morte de seu pai adotivo, vítima de um infarto. Após completar dezoito anos, resolve ir embora, em sua jornada de descobrimento, aonde fica por doze anos ausente, em sua Fortaleza da Solidão, no Polo Norte.

Na terceira parte, Clark Kent, já adulto, chega em Metrópolis, e arruma um emprego no renomado jornal O Planeta Diário. Nesse ambiente conhece seu chefe Perry White (Jackie Cooper), o fotógrafo Jimmy Olsen (Marc McClure) e seu grande interesse amoroso, a destemida e determinada jornalista Lois Lane (Margot Kidder). Em Metrópolis também somos apresentados ao grande vilão Lex Luthor (Gene Hackman) e seus capangas, o atrapalhado Otis (Ned Beaty) e Srta.Teschmacher (Valerie Perrine). Os três vivem em uma fortaleza subterrânea, em algum lugar na grande cidade, e lá Lex arquiteta o que ele chama de O Crime do Século.

Nesse ponto, com todos os indivíduos importantes apresentados, já se passaram mais de uma hora de filme, e até então, nenhuma cena de ação envolvendo o Superman, ninguém ainda o conhecia. E isso não é nenhum defeito, pelo contrário, o roteiro é tão bom, os personagens são tão bem construídos, atento aos detalhes, sem pressa, tudo muito bem conduzido pelas mãos de Donner, tudo vai se desenvolvendo e preparando o terreno para finalmente mostrar ao mundo o herói salvador, em uma cena memorável, salvando Lois Lane, que estava para cair  do prédio do Planeta Diário, após um incidente com um helicóptero.

O elenco mesclando atores já consagrados, veteranos, e jovens iniciantes é muito afiado, o entrosamento é notório. Christopher Reeve e Margot Kidder tem a química perfeita, tanto ao reproduzir a amizade entre Lois e Clark, quanto ao interesse afetivo entre Lois e Superman. Aliás, a cena com os dois voando juntos é belíssima, poética, tudo regido pela bela trilha, a qual já idolatrei muito logo acima.

Superman foi um grande sucesso de público e crítica, arrecadando no mundo todo cerca de 300 milhões de dólares, algo que convertido para valores atuais, superariam a marca de 1 bilhão. E após o êxito, as atenções se voltaram para o término da sequência, porém, Richard Donner foi demitido, mesmo já tendo quase 80% do filme finalizado. E em seu lugar fora escalado Richard Lester, famoso diretor conhecido por inserir os Beatles no cinema, com os filmes A Hard day’s Night (1964) e Help! (1965). E assim as coisas desandaram, Lester nunca teve a competência de Donner, e os filmes ficaram mais próximos da visão desejada pelos Salkind, e foi perdendo força. Superman II (1980) ainda foi um filme razoável, tem um pouco de Richard Donner alí (mas o mais recomendável é assistir a versão Superman II – The Richard Donner Cut, lançado em 2006); e Superman III (1983), honestamente, é deplorável, algo pra ser esquecido, só tem uma cena interessante, mas isso não vem ao caso. Já Superman IV (1987), que também foi um fiasco, não tinha mais a mão dos Salkind e nem de Lester, e é considerado um dos piores filmes de todos os tempos, muito devido aos seus problemas de produção.

Uma pena os rumos que as produções seguintes tomaram, fico imaginando como teria sido se o Homem de Aço tivesse uma trilogia de respeito, todos os filmes com o mesmo nível de qualidade do primeiro, seria, no mínimo, incrível. Mas pelo menos, é certo se dizer que, Superman – O Filme tem o seu devido lugar garantido no Olimpo dos filmes de super-heróis, revolucionou o gênero e mudou a forma com que as pessoas, e o próprio cinema, viam as adaptações de HQs. E ainda, com mais de quarenta anos de seu lançamento, continua voando alto. Uma obra inesquecível.

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Dados Técnicos.

Título: Superman – O Filme (1978)
País: EUA, Reino Unido.
Duração: 2 horas e 25 minutos.
Direção: Richard Donner.
Elenco: Christopher Reeve, Marlon Brando, Gene Hackman, Ned Beatty, Jackie Cooper, Glenn Ford, Trevor Howard, Margot Kidder, Valerie Perrine, Maria Schell, Terence Stamp, Phyllis Thaxter e Susannah York.

Sinopse: Jor-El (Marlon Brando), um renomado cientista, prevê a destruição do seu planeta e alerta o governo, que não lhe dá credito. Assim, decide salvar seu filho, mandando-o para a Terra, onde terá superpoderes. Na Terra, ele usa o nome de Clark Kent (Christopher Reeve) e já adulto e trabalhando como repórter em um jornal, não demonstra ter superpoderes. Mas quando uma situação inesperada põe em risco a vida de Lois Lane (Margot Kidder), uma colega de trabalho, ele obrigado a se revelar para o público, ficando conhecido popularmente como Superman. Descontente com o surgimento de um super-herói na cidade, Lex Luthor (Gene Hackman), um gênio do mal, o obriga a se desdobrar para evitar a morte de milhões de pessoas.