“Joana cujo coração se tornou o coração da França.
Joana, cuja memória será sempre amada…”
A Paixão de Joana d’Arc ou O Martírio de Joana d’Arc, como também é conhecido, é um filme francês, lançado em 1928 e dirigido pelo dinamarquês Carl Theodor Dreyer. Tido por muitos críticos como a principal obra de seu realizador, e um dos maiores clássicos do cinema mudo.
O filme tem seu roteiro baseado em documentos históricos e oficiais, encontrados na Biblioteca da Câmara dos Deputados de Paris, que descrevem com fidelidade o julgamento, tortura, condenação, e execução da guerreira Joana d’Arc, começando a partir do momento em que ela é capturada pelo exército inglês, abandonada por seus aliados, ficando a mercê dos inquisidores britânicos.
Para o papel da protagonista, foi escalada a excelente atriz de teatro francesa Renée Jeanne Falconetti (muitas vezes creditada como Maria Falconetti, Marie Falconetti ou Renée Maria Falconetti), e nela está um dos principais, se não o principal trunfo de toda a obra, sua atuação é no mínimo brilhante. Falconetti encarna a heroína francesa em seu martírio, já sozinha, abandonada, mas sempre fiel a seus seguimentos e sua fé, de forma magnífica. Abordando com um realismo ímpar todo o sofrimento da prisioneira, com as torturas físicas e psicológicas das quais ela fora submetida. Suas expressões de dor, tristeza, desespero, angústia, decepção e determinação naquilo que seguia, são de uma grande profundidade, digna de figurar entre as melhores atuações de todos os tempos. Pena que sua carreira como atriz nas telonas durou pouco, seu trabalho como Joana d’Arc, foi seu segundo e último papel no cinema. Diz-se, que após trabalhar com Dreyer, ela entrou em colapso emocional, e que as filmagens foram um verdadeiro calvário, devido às fortes exigências do diretor. Desde então, Falconetti trabalhou como produtora em filmes menores de comédia, até sua morte em 1946.
A princípio, Carl Theodor Dreyer queria realizar um filme sonoro, utilizando essa nova técnica, que teve seu início no ano anterior, em 1927, com “O Cantor de Jazz” de Alan Crosland, primeiro filme falado da história, mas devido ao baixo orçamento, optou por um filme mudo. O que não causou nenhum efeito negativo, pelo contrário, ao realizar um filme sem falas, Dreyer mostra toda sua genialidade, com movimentos de câmera e closes nunca vistos antes, sendo um pioneiro ao trazer técnicas tão inovadoras de filmagem. O diretor ainda exigiu que seu elenco não usasse maquiagem, para que pudesse extrair ao máximo todas as expressões faciais, demonstrando o mais realista possível todos os sentimentos de seus personagens. Algo que era característico de Dreyer, que sempre tentava absorver o máximo de seus atores, penetrando profundamente em seus pensamentos através de imagens. Destaque também para a belíssima fotografia do polonês Rudolph Maté, que claramente teve sua inspiração no Expressionismo Alemão, movimento que ganhara destaque na década de 20.
La Passion foi banida do Reino Unido, com a alegação de que, a forma que fora mostrado o martírio de Joana d’Arc, graficamente remetia à Paixão de Cristo. A tortura sofrida por ela nas mãos dos soldados franceses, se assemelhava muito a de Jesus sob o exército romano, o que na verdade, era a intenção de seu diretor. Dreyer, que ficou conhecido como “cineasta da vida interior” ou “cineasta da alma”, sempre abordou temas considerados “pesados” e sombrios pra sua época. Temas recorrentes em seus trabalhos, como o auto-sacrifício, fé, problemas de religiões, opressão à mulher, o sacrifício feminino, fizeram com que algumas produtoras rejeitassem seus projetos, sempre tendo que se mudar e procurar outras empresas e países para realizar seus filmes, tendo trabalhado na Dinamarca, Alemanha, França e Suécia.
Esse grande artista dinamarquês, sempre esteve à frente de seu tempo, visionário, causou uma grande revolução na sétima arte, desde os tempos do cinema mudo. E mesmo sofrendo com críticas em sua época, hoje é tido como o maior diretor de seu país, e um dos mais importantes da história do cinema, sendo inspiração para muitos, inclusive, seu conterrâneo realizador Lars Von Trier, se diz seu discípulo.
E “A Paixão de Joana d’Arc”, com certeza é sua obra-prima, juntamente com “A Palavra” (Ordet) de 1955, outra obra de arte do cineasta (provavelmente, um dia falarei sobre).
Enfim, essa película de 1928 é extremamente relevante para história do cinema, entra fácil em qualquer “lista obrigatória” para cinéfilos. E sem sombra de dúvidas, é de longe, a melhor adaptação cinematográfica sobre a padroeira da França, que obteve algumas conquistas importantes durante a Guerra dos Cem Anos, embate entre França e Inglaterra que durou mais de um século, sendo canonizada em 1920 pelo Papa Bento XV, se tornando Santa Joana d’Arc, um grande exemplo de força, coragem, fé e determinação.
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Dados Técnicos.
Título: A Paixão de Joana d’Arc (La Passion de Jeanne d’Arc) – 1928
País: França
Duração: 1 hora e 50 minutos
Direção: Carl Theodor Dreyer
Elenco: Renée Jeanne Falconetti, Eugene Silvain, Andre Berley, Maurice Schutz, Antonin Artaud, Michel Simon, Jean d’Yd…
Sinopse: A jovem camponesa Joana D’Arc (Maria Falconetti) é condenada à morte por ter liderado o povo francês contra o exército invasor inglês, dizendo que foi inspirada por Jesus e São Miguel. Ela passa pelas suas últimas horas de vida em que é capturada pelos ingleses, levada à prisão, torturada, vai à julgamento por heresia e por fim é executada. Durante todo esse tempo, ela sofre por causa das acusações e também devido ao abandono da Igreja Católica e dos seus compatriotas franceses.